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O Pedro

  • Lilian Fleuri
  • Jun 15, 2014
  • 5 min read

Pedro foi toda uma descoberta. Como primeiro filho, ele tem sido quem nos ensinou o caminho a seguir. Questionamos inúmeras vezes nosso método, avaliamos, reavaliamos, mudamos e continuamos com a mesma abordagem e até hoje não temos certeza se estamos no caminho certo.

Quando Pedro nasceu morávamos no Brasil. Victor continuava a falar comigo em espanhol e eu, em português, apesar de minhas tentativas frustradas de lhe responder em espanhol. Logo nos surgiu a oportunidade de nos mudarmos à Austrália. Nos mudamos quando Pedro tinha apenas 8 meses e meio, em 2011. Desde então o ciclo de amizades que frequentávamos era hispano e lusofalantes, de México e Brasil. Pedro teve contato exclusivo com português e espanhol até um ano e meio, quando começou a frequentar a creche, cinco dias por semanda, das 9am as 4pm.

Suas primeiras palavras não eram tanto relacionadas ao idioma, e sim à facilidade fonética que encontrava em cada palavra. As três línguas de fato lhe favoreceram nesta primeira fase, pois podia escolher uma palavra de cada idioma para expressar o que queria. Suas primeiras palavras, então, foram com sílabas explosivas (também chamadas de oclusivas) B, T , D, P e G. Assim, sua primeira palavra foi "bye-bye" aos dez meses, ao despedir-se de sua professora na creche. Logo "batata", "daddy", "aga" (agua), "wata" (water), "hat", "papa(i)", para nomear algumas que me lembro. Me lembro que ele demorou para dizer "mama" ou "mamãe", que veio por volta dos dois anos de idade. Perto dos dois anos já falava bastante palavras soltas, suas preferida era "moto".

Com um ano e oito meses fomos eu e ele ao Brasil por 5 semanas (para todo o mês de janeiro/2012). Em contato constante com avós e tio, ouvindo apenas português e recebendo estímulos diversos, sua fala deslanchou em termos de aquisição de vocabulário. Ele ainda não montava frases. Sua fala era formada por palavras soltas relacionadas a sua expressão corporal. A dicção ainda não era completa e palavras trissílabas eram mais difíceis de serem pronunciadas. Para citar um exemplo, o S era pronunciado como T e como resultado muitas palavras soavam como "tatatoto".

Ao completar dois anos, recebemos a visita de meus sogros, cunhada e sobrinhos (mexicanos todos), por um mês (início de abril/2012). Sua prima com 3 anos na época, falante exclusivamente de espanhol, já montava frases completas, com uma variedade relativamente rica de vocabulário. Nesta fase, Pedro começou a adquirir mais vocabulário em espanhol, ainda misturando muito com o português. Pelo que posso me lembrar, Pedro falava do mesmo modo pra todos, mas gradativamente falava mais em espanhol com a presença dos "abuelos", pois nenhum deles compreendia português. Me lembro, que na disputa de espaço e de pertences com sua prima, ouvia muito as palavras "no", "mio" e "mira" (para apontar o que queria dizer e fazer mimicas).

Em seguida chegaram meus pais (brasileiros) pra ficar um mês (final de abril/2012). Toda a familia, mexicana e brasileira, ficou reunida por uma semana, até que minha família mexica foi embora. Parte pelos avós e abuelos conseguirem adivinhar o que Pedro queria dizer, e parte por Pedro se expressar pouco em ambas as línguas, ele parecia não ter dificuldade em se interagir e transitar entre esses dois contextos linguísticos.

O inglês nessa época ficou relegado a segundo plano. Assim que voltamos do Brasil ele voltou a ir à creche 5 vezes por semana. Chorava todos os dias que o deixava lá. Vi que ele conseguia falar ainda "hat" (e de jeito nenhum falava "sombrero" ou "chapéu"), "mine", "what you doing" (whatuduing), "blue", "yellow", "water", "apple" etc. Quando meus sogros chegaram, o tiramos da creche para que aproveitasse mais o tempo com os familiares, ficando 2 meses sem contato com o inglês (inclusive filmes e músicas eram em português e espanhol).

Em termos de comportamento, Pedro sempre foi um pouco "antissocial", ou seja, quando bebê chorava ao ver estranhos; ao deixá-lo com outros para que o cuidassem (mesmo amigos ou familiares) ele chorava; nunca gostou de ficar na creche e sempre chorava quando o deixava. Na verdade chorou TODOS OS DIAS que o levei para a escolinha. Só parou quando completou 4 anos, e ainda assim tem dias que se recusa a ficar na escolinha e gruda em mim e chora quando vou embora. Essa personalidade fazia com que ele sempre apreciasse brincar sozinho, limitando o contato social e a comunicação com outras crianças em inglês. Entretanto ele brincava bem com adultos, principalmente os falantes de português, e conosco, seus pais.

Já no meio de crianças hispano-falantes, seus amigos fora da escola, filhos de amigos nossos mexicanos e crianças do playgroup de espanhol, ele se relacionava mais, mesmo assim a seu modo. Observando outras crianças via que a socialização entre crianças da mesma idade, na faixa dos 2 anos, é um pouco tenso, principalmente se não sabem falar bem. Então mantinhamos ele em contato com outras crianças hispano-falantes, fora da escola.

Em 2013 meus sogros voltaram a nos visitar por um mês, no aniversário de 3 anos do Pedro. Nesta época já tínhamos um grande ciclo de amizade hispânica, todos casais com filhos da mesma idade de Pedro, ou um pouco mais velhos, e todas crianças cujos idiomas eram espanhol em casa e inglês na escola. Neste momento achei que o vocabulário em espanhol dele estava maior que o em português. Este também foi o ano que deixei de trabalhar e que engravidei de Matias. Pedro também passou a ir apenas 2 dias por semana na creche, a ficar mais comigo e a frequentar playgroups de espanhol e de português todas as semanas, 1 vez por semana cada. Uma vez por semana também o mantive em aula de futebol (em inglês) e de natação (em inglês). Curiosamente essas aulas ele também não gostava de ir e chorava ao deixá-lo.

Por meados de 2013, ele deixou de te aulas de futebol (por se recusar a fazê-las) e de natação (por estar muito frio e se gripar constantemente), também passou a ir apenas uma vez à creche. Ele começou a se interagir mais com as crianças do playgroup em português, com o qual se identificou muito, conseguia se expressar melhor e consequentemente a se comunicar melhor. Nesta época, Victor mudou o horário de entrada no trabalho para que pudesse passar mais tempo com Pedro e lhe falar mais em espanhol, já que passava todo o dia comigo. Ao chegar em casa, as 3h30pm, Victor tinha uma rotina de brincar com ele (espanhol), dar banho (espanhol), jantávamos (espanhol e português), via tv (inglês) ou brincava sozinho com seus brinquedos (sua língua), e Victor lhe contava uma história (sempre lida em espanhol - traduzida ou não).

Um fato curioso que aconteceu com Pedro quando entrou aos três anos foi que ele começou a manifestar uma gagueira que realmente nos preocupou, pois durou cerca de um ano. Ele travava completamente em palavras monossílabas e ao começar uma frase.


 
 
 

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Quem sou

Meu nome é Lilian Fleuri. 

Sou muitas Lilians, em cada papel que desempenho me empenho. Sou mulher, filha, irmã, brasileira, professora, pesquisadora, esposa, mãe, amiga. Nesses papeis desenvolvo muitas atividades diarias como coordenadora de playgroups, educadora, pesquisadora, tradutora, professora, web-designer, bloggeira, revisora de texto, organizadora de festinhas infatis, cozinheira, escritora, linguista... e assim vai...

 

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